Nas décadas de 70 e 80, a Taxa Selic já chegou a patamares de 115 mil % nos momentos de maior descontrole inflacionário. Hoje, em contraste a isso, ela acabou de sofrer uma redução de 0,5 ponto percentual, atingindo sua mínima histórica de 5% ao ano. Essa é a terceira queda consecutiva após mais de um ano de estagnação e a previsão dos economistas é que a taxa abaixe ainda mais nos próximos meses. O Banco Central estima que já em Dezembro ela caia para 4,5%. Mas o que isso significa para a população brasileira? Bom, para responder isso, é preciso começar entendendo o que é esse indicador.
O QUE É TAXA SELIC?
Para financiar suas atividades, o governo brasileiro precisa arrecadar recursos. Esse dinheiro é adquirido através de dois principais meios: a cobrança de impostos, pagos por empresas e pela população, e empréstimos. A forma mais comum de realizar esse último é via títulos do Tesouro Nacional. Esses são promessas de pagamentos emitidas pelo Estado, o qual passa a ser um devedor de quem as compra. Sendo a Selic (Sistema Especial de Liquidação e Custódia) a taxa de juros aplicada nas operações diárias entre instituições que usam os títulos públicos federais. Ficou claro? Provavelmente não! Simplificando, a taxa Selic é a remuneração que o governo paga aos seus credores.
A fim de compreendermos melhor o funcionamento da Selic, é interessante analisar a influência dessa taxa na tomada de decisões de bancos e de outras instituições financeiras importantes, como empresas de aluguel, de seguros e fundos de investimento. Esses agentes econômicos têm suas operações de empréstimo e captação de dinheiro fortemente influenciadas pela Selic e, por serem lastreados pelo Banco Central, os títulos públicos são considerados uma das aplicações mais seguras. Tal segurança se dá pelo fato do Estado ser sempre a última das esferas a falir, por mais grave que seja a crise. Como ele geralmente é quem mais aporta capital na economia, sua quebra indica que a maior parte das empresas que compõem o país também já faliram. Assim, a Selic pode ser vista como a taxa básica de juros da economia.
O entendimento é simples: se o investimento com menor risco atrelado está me oferecendo a Selic como retorno, não faz sentido que pessoas e empresas paguem abaixo dessa porcentagem. Dessa forma, os juros ministrados na economia são maiores pelo prêmio de risco, quanto maior a probabilidade de inadimplência, mais altas serão as taxas. O cheque especial, por exemplo, é um empréstimo sem nenhuma garantia para o banco, logo, caso o devedor não pague sua dívida, a agência bancária não tem como recuperar o seu capital, o que aumenta o risco da operação. O resultado? Juros de 307% ao ano, um dos maiores do mundo. Desse modo, quando a taxa básica (Selic) sobe, todos juros de empréstimos tendem a subir.
Agora que entendemos o que é a Selic e como impacta em todas transações financeiras no Brasil, precisamos entender como é quantificada. O Banco Central decide o valor da taxa a cada 45 dias por meio do Copom (Comitê de Política Monetária). Diante das possibilidades de corte, manutenção ou aumento da taxa, há o estudo da evolução e previsões das economias brasileira e mundial, das condições de liquidez e do comportamento dos mercados. Além do cenário econômico atual, os riscos associados também são levados em consideração, pois essa decisão irá afetar todo o país.
CONSEQUÊNCIAS NA MACROECONOMIA
Um dos principais fatores que faz o Copom alterar a Selic é a inflação, que podemos acompanhar por meio do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), principal métrica inflacionária do país. Mas também há o impacto inverso. Quando a Selic é aumentada, os juros aplicados na economia tendem a subir também. Dessa forma, o crédito para as pessoas encarece, estimulando a consumir menos e poupar mais. Além disso, as empresas evitam fazer grandes investimentos internamente, podendo até reduzir seu número de funcionários. Como consequência, a oferta torna-se maior que a demanda e ocorre uma desaceleração na atividade econômica. Nesse cenário, os preços descem de nível, fazendo o IPCA cair junto.
Já quando o Banco Central determina uma queda na Selic há o movimento contrário. Os juros cobrados em empréstimo e no cartão de crédito ficam mais atrativos, assim a população tende a poupar menos e consumir mais. Analogamente, as empresas aproveitam esses cortes na taxa para investir e até contratar mais. A alta demanda por produtos faz a economia crescer e os preços subirem e, naturalmente, gera um aumento inflacionário.
Visto isso, pode-se dizer que as duas porcentagens sofrem influência mútua e inversamente proporcional. O aumento da Selic, normalmente, é sucedido de grandes períodos de inflação com intuito de freá-la e a queda dessa taxa tende a aquecer a economia, elevando o IPCA. Esse último, é o cenário atual do Brasil e será possível acompanhar, nos próximos anos, a repercussão dessas escolhas do Copom. O gráfico abaixo, demonstra a performance desses dois índices na última década e como as decisões do Banco Central influenciaram a economia do país.
Podemos reiterar pelas séries históricas dos dois índices que os aumentos da Selic são posteriores aos crescimentos do IPCA, a fim de retardá-lo. Isso pode ser visto em 2015, no qual a taxa Selic foi a maior dos últimos 10 anos para retardar a inflação e evitar que o país, em um cenário mais grave, voltasse para o quadro de hiperinflação, que viveu nas décadas de 70 e 80.
Já a queda da Selic, que a princípio, parece ser ruim por estimular o aumento do preço em todo mercado, pode ser benéfica à economia. É visando o crescimento do país que a taxa vem sofrendo essas quedas, dado que, com essa ação, o Banco Central encoraja o acesso a crédito mais barato por parte da população e, consequentemente, também potencializa o consumo. Já para os 40% dos brasileiros que estão inadimplentes, os juros ficarão mais suavizados, o que facilita a renegociação de suas dívidas.
As empresas também têm maior facilidade em crescer pela menor taxa. Além da redução dos juros das dívidas, o maior acesso ao crédito é mais importante do que para a população, pois pode economizar até milhões de reais. Assim, estimula-se o setor produtivo do Brasil e, consequentemente, criação de valor pela produção de bens e serviços, proporcionando mais empregos. Dessa forma, o valor de mercado das empresas tende a oscilar, variando dessa maneira, os preços das ações negociadas na bolsa.
COMO O CENÁRIO ATUAL AFETA OS INVESTIMENTOS?
A maioria das aplicações disponíveis no mercado estão de alguma forma atreladas à Selic, seja direta ou indiretamente. O impacto mais imediato é o Tesouro Selic, investimento no qual se empresta dinheiro ao governo com rentabilidade pós-fixada à taxa básica. Por exemplo, comprar um título Selic + 0,02% significa que, ao final do período, o investidor receberá o preço de compra ajustado pela taxa Selic com um acréscimo de 0,02%. Ou seja, a queda dessa taxa impacta quem possui esse tipo de ativo.
Não só o Estado emite títulos para financiar sua própria dívida; empresas, bancos e outras instituições também vendem ativos que garantem uma certa rentabilidade. Normalmente, essas investimentos são ligados à Selic, caindo proporcionalmente com a taxa e ficando menos atrativos. Tais aplicações têm como exemplo:
Certificados de Depósito Bancário (CDB)
Letras de Crédito Imobiliário (LCI)
Letras de Crédito do Agronegócio (LCA)
Letras de Câmbio (LC)
Fundos de investimento DI (Fundos DI)
Embora a rentabilidade da renda fixa tenha diminuído, esses investimentos continuam sendo as opções com maior segurança de se aplicar. Logo, para perfis conservadores, deve compor a maior parte da carteira com esses ativos. No entanto, com a perspectiva de uma inflação crescente, é importante entender que o poder de compra da população diminui e assim o retorno real das aplicações também decresce. Hoje, a Selic de 5% a.a., quando comparada com o IPCA projetado de 3,66%, segundo o relatório de Novembro do Banco Central, renderá apenas 1,29% acima da inflação. Portanto, rendimentos que performam abaixo da Selic, como a poupança, passam a rentabilizar quase zero após o desconto inflacionário. Além disso, o futuro da renda fixa só tende a piorar ao analisar a projeção de taxa de juros real elaborada pelo Itaú Unibanco no início do ano.
Esse lucro real é muito baixo quando comparado ao retorno médio da bolsa de valores brasileira, que fica em torno de 8% após descontar a inflação, sendo muito mais atrativo. Por outro lado, o potencial de ganho da renda variável está atrelado a riscos e incertezas e, como já mencionado, a variação da taxa Selic tende a influenciar o preço das ações, dificultando a escolha do ativo. Porém, mesmo sem muito conhecimento, é possível aproveitar o aquecimento do mercado e diversificar a carteira com Fundos Multimercados e Fundos Imobiliários. Esses investimentos, geralmente, rendem mais que a renda fixa e os riscos são reduzidos pelo fato das ações serem alocadas por gestores profissionais e pela diversificação dos ativos dentro dos fundos.
É possível perceber, então, que a Selic e a inflação estarão sempre oscilando, e isso não é necessariamente ruim para a economia ou para os investidores. Se as grandes reformas governamentais previstas forem de fato aprovadas, e se o IPCA permanecer controlado, é possível que os juros fiquem baixos por um tempo. Portanto, é preciso entender como a menor taxa de juros da história impacta sua vida, não somente para se adaptar financeiramente ao novo cenário, como também rentabilizar nele.
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