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Foto do escritorRAFAEL ALVES BORGES DE CARVALHO

Guilherme Benchimol e a XP: perseverança que gerou inovação

Atualizado: 12 de abr. de 2021



Fracasso. Essa foi a semente que, em 2001, germinou uma das maiores histórias de sucesso do Brasil. Nela, o carioca Guilherme Benchimol fundou o que se tornaria a maior corretora de investimentos do país, a XP Investimentos. Em uma jornada repleta de perseverança e disrupção, a empresa conquistou mais de 1,5 milhão de clientes em 18 anos e, atualmente, possui cerca de 350 bilhões de reais sob custódia. Esses números impressionam quando analisamos o contexto de sua criação.


A origem conturbada

Na infância de Guilherme reside um dos principais aspectos que, indiretamente, resultou na criação da XP: a linha dura imposta pelo pai. Sempre envolto em uma atmosfera de reprovação, a figura paterna gerava uma constante sensação de falha. Como resultado, desde cedo Benchimol já sabia que queria se libertar dessa realidade e acreditava que isso poderia ser feito através de sua autonomia financeira.


Tendo esse objetivo em mente, o garoto optou por cursar economia. Nesse período, no entanto, novamente as pequenas frustrações do dia a dia inundavam sua cabeça. Ele não se encaixava no perfil acadêmico tradicional da universidade em que estudou e nem obteve destaque nos estágios nos quais trabalhou. Com dificuldades, formou-se em 1999 e finalmente poderia focar em ganhar o dinheiro que tanto queria.


Seis meses após sua formatura, Guilherme começou a trabalhar na Investshop, uma startup nascida dentro do banco Bozano, instituição de pequeno/médio porte na época. Com o intuito de tirar o brasileiro das mãos das grandes instituições financeiras e fazê-lo aplicar melhor seu capital, essa iniciativa tinha como principal produto uma plataforma que atendia pessoas físicas que desejassem investir. Isso era feito através da oferta de produtos financeiros mais diversificados do que os oferecidos pelos grandes bancos aos seus clientes. Essa inspiradora missão nunca saiu da cabeça de Benchimol e representou uma das únicas atividades com a qual se engajou e se identificou até então.


Durante os quase 2 anos em que trabalhou na Investshop, amadureceu seu perfil profissional por meio de atividades relacionadas à busca por novos clientes e corretoras de investimentos - empresas que intermediam a compra de produtos financeiros - que aderissem à plataforma. A ideia é que essas corretoras usassem a plataforma como uma “vitrine” para expor seus itens. Tudo parecia correr bem até que, em 2000, a bolha da internet estourou, resultando em um corte de funcionários da companhia. Para Guilherme, a demissão foi traumatizante. O emprego que amava agora se juntava à coleção de falhas e frustrações que sempre se acumularam em sua cabeça. Na tentativa de deixar os fracassos para trás, se mudou para Porto Alegre.


Trocar o mercado financeiro carioca pelo gaúcho inicialmente aparenta ser uma atitude sem qualquer base racional, já que no Rio havia maior foco de empresas atuantes no setor financeiro, mas Guilherme estava convicto de que era a melhor escolha. Apesar do ato visar o rompimento com o passado, o início de sua jornada ao sul teve forte ligação com os meses anteriores de sua vida. Seu objetivo era implementar o uso da plataforma da Investshop na corretora Diferencial, uma corretora de Porto Alegre com a qual teve contato em seu antigo trabalho. A medida foi adotada e Benchimol, por sua vez, passou a atuar como agente autônomo - uma espécie de corretor sem vínculo empregatício com a empresa - ganhando através das comissões decorrentes de indicações de uso da plataforma.


O modelo autônomo, relativamente novo no país, durou alguns meses, mas o alinhamento das atividades com a corretora não ocorreu conforme o esperado. Tendo isso em vista, Guilherme e Marcelo Maisonnave - outro jovem, em um contexto de vida semelhante e que o ajudava a administrar essa célula autônoma - optaram por romper seu vínculo com a Diferencial e abrir seu próprio negócio.


Nasce a XP

Em 2001, nascia a XP Investimentos.


Sem nenhum planejamento razoável ou significado especial por trás do nome, os dois jovens criaram a XP. A mudança teve apenas caráter simbólico, dado que suas rotinas não mudaram muito. Entretanto, símbolos têm sua importância, e aquele representava o broto de uma das mais inspiradoras histórias de empreendedorismo do Brasil. Operando sobre o mesmo modelo, levando clientes para a plataforma Investshop e capitalizando através das comissões, os primeiros anos da XP foram árduos. Com uma taxa Selic que caminhava para 25%, investimentos fora da bolsa possuíam uma boa rentabilidade com menor risco atrelado, configurando um cenário apocalíptico para uma pequena empresa tentando atrair investidores para a renda variável. Junto a isso, em 2002 menos de 90 mil brasileiros investiam em ações.


Para transpor as barreiras impostas pelo contexto, Guilherme e Marcelo ampliaram a equipe da XP. Ela passou a ter quatro componentes, que começaram a realizar aulas e palestras para oferecer conhecimentos sobre ações e bolsa de valores aos potenciais clientes, pretendendo convertê-los em investidores. O que não esperavam é que o retorno viria através do aumento da adesão às aulas, e não do aumento da taxa de conversão. Em pouco tempo, a empresa se viu crescendo por meio da venda de cursos e, com a receita gerada, iniciou sua expansão.


O modelo de negócio inovador

Esse era o início de uma grande capilarização característica do desenvolvimento da empresa. Parcerias com agentes autônomos, também dispostos a dar aulas, impulsionaram o crescimento sobre o modelo de produção de conteúdo e, em poucos meses, a XP abriu dois escritórios em outras cidades da região. No entanto, o viés educacional, embora inovador no setor, não era a ambição dos fundadores. Essa etapa foi somente criada com a finalidade de converter os alunos em clientes ativos.


Após um olhar aprofundado para as aulas que ofereciam, notaram que a baixa conversão se dava, provavelmente, pela carência de ensinamentos realmente práticos sobre compra e venda de ações. Para contornar esse obstáculo, fizeram um novo conteúdo funcional, embasado em métricas simples e de fácil compreensão. Também nasceu naquele momento o serviço para o cliente: os agentes autônomos ligados à empresa telefonavam para avisar quando uma ação tinha dado ponto de compra ou de venda. Foi dessa forma que a XP Investimentos encontrou um modelo vencedor e se expandiu ainda mais, num ótimo momento, em 2003, quando começou um longo período de valorização de ações na bolsa brasileira.


Para consolidar o crescimento da empresa, Guilherme e seus sócios criaram a XP Gestão, um dos seus primeiros fundos de gestão de investimentos próprios. Dessa forma, houve aumento da estabilidade, pois ocorreu a atração de clientes mais conservadores e, além disso, a atividade não tinha nenhum vínculo financeiro com a Investshop, que ainda comia grande parte do seu faturamento.


Os anos foram se passando e o modelo de negócio da XP foi chamando atenção. Grandes players chegaram a ofertar milhões pela empresa, negados pelos sócios, que viam um propósito maior em seu projeto. Com a expansão, também surgiram mais ramificações, como a criação da XP Educação, um braço que passou a administrar os cursos da empresa por todo Brasil.


Por fim, a maior mudança ocorreu em meados de 2007, quando a XP virou de fato uma corretora de investimentos através da aquisição de 95% da Americainvest, uma corretora carioca que estava à beira da falência. Pode parecer contraditório, mas até então ela não atuava dessa forma. Uma das mudanças mais relevantes dessa grande transição seria a monetização via corretagem - que é a taxa de intermediação da compra de ativos financeiros. Tudo isso ocorreu na hora certa, tendo em vista que no momento a taxa Selic estava relativamente baixa, em torno dos 13%, e os investidores buscavam se aventurar mais pelas ações da bolsa de valores. Inevitavelmente, imaginamos que essa guinada teria fim no ano seguinte, com a crise de 2008, mas a empresa já estava consolidada, operando de forma que não sentiu impacto no seu faturamento.


O caminho para o IPO

Nos anos subsequentes, a XP gradativamente se estabeleceu como uma das gigantes do setor, muito em função da sua prática de M&A (fusões e aquisições). O crescimento foi tamanho que, em 2017, a corretora chamou atenção do atual maior banco brasileiro, o Itaú Unibanco, que demonstrou forte interesse em comprar uma parcela societária. As negociações foram envoltas por um clima de controvérsia, uma vez que a XP nasceu com o propósito de “desbancarizar” os investidores brasileiros, alegando que os faria investir melhor o seu capital. Após meses de reuniões e acordos complicados, o Itaú comprou uma parcela de 49,9% da XP pelo preço de 6,6 bilhões de reais. O resultado desse acontecimento, no entanto, difere do esperado pela maioria, pois a operação não resultou em uma fusão de fato, mantendo ambas as partes administrativas independentes entre si.


Dois anos mais tarde, no dia 11 de dezembro de 2019, a XP Inc. - sociedade que administra todas as frentes em que o grupo XP atua - deu o que seria um dos passos mais importantes da sua história: abriu seu capital na Nasdaq, bolsa de valores americana voltada para empresas de tecnologia. A avaliação da empresa em quase 15 bilhões de dólares fizeram da XP o maior IPO (Oferta Pública Inicial) de uma empresa brasileira neste ano.



A companhia alega que o motivo para a abertura de capital no exterior seria a possibilidade de se conectar com os principais investidores do mundo, o que traria uma agregadora prática internacional para a XP. Além disso, também foi uma forma de se blindar contra legislações menos liberais e mais imprevisíveis vigentes no Brasil. Não é descartada, todavia, a possibilidade de abertura de capital em solo nacional no futuro.


O fato de que, em apenas 2 anos, a empresa aumentou seu valor em mais de 60 bilhões de reais gera surpresa. Mas quando observamos fatores como o crescimento aceleradíssimo de seu faturamento, que passou de 1,4 bilhões em 2017 para 3,7 bilhões somente nos três primeiros trimestres de 2019, tomamos conhecimento da dimensão que a joia nacional deve tomar nos próximos anos.


É apenas o começo

A XP, sobre a qual sabemos um pouco mais agora, nasceu com um propósito: melhorar a forma como o brasileiro investe seu dinheiro. Sua inquietação com a centralização dos investimentos nos grandes bancos tradicionais já causa enorme desconforto nessas instituições. É só uma questão de tempo para que, no ritmo frenético em que cresce, o seu market share, de apenas 3%, se equipare ao das velhas organizações.


Isso é exatamente o que Benchimol almeja. Se definindo como “um cara raçudo”, sua juventude foi marcada pela culpa de não ter emplacado em nada que fez, mas também nunca desistiu de tentar. Mesmo errando muito, acertou em cheio uma vez e foi exemplar, ensinando que a excelência se demonstra no longo prazo. Sua história vai especialmente para os que não se veem como prodígios e, por isso, não se atrevem a tentar. O menino tímido do Rio de Janeiro transmitiu com êxito seus aspectos de perseverança individuais à cultura do grupo XP que, mesmo depois de tantas conquistas, enxerga tudo isso como o início de uma jornada. Norteados pela sua missão, transformaram o fracasso inicial em uma obsessão pelo sucesso e, com isso, revolucionam o mercado financeiro brasileiro.

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