Ganhando destaque com quase três mil mortes e 85 mil infectados até então, o Coronavírus (recém batizado de Covid-19) se tornou uma nova preocupação mundial. Diversos governos estão tomando medidas novas a cada dia para proteger suas populações e suas fronteiras do vírus, enquanto a ciência busca, desesperadamente, um tratamento. A doença, contudo, continua se alastrando, e a epidemia parece estar no caminho de se tornar uma pandemia.
Devido ao caos causado no sistema de saúde com essa epidemia, o governo chinês precisou tomar medidas urgentes para atender a falta de capacidade de seus hospitais. A título de exemplo, na cidade de Wuhan - onde 50 mil pessoas estão sendo mantidas sob quarentena - a calamidade foi tamanha que foi necessária a construção de um novo hospital em apenas 10 dias. Esse acontecimento expressivo denota a urgência de tratamento requisitada nos maiores focos globais da epidemia. A doença, contudo, não se restringe apenas a saúde das pessoas e a esse setor, mas afeta a economia global.
A proliferação
Posterior a esse cenário, o problema começa a migrar para outros setores da economia. Com trabalhadores doentes e potencialmente tendo que cuidar de familiares infectados, a oferta de mão de obra começa a reduzir, causando retração nas atividades produtivas. O medo de ser infectado causa o distanciamento da população de espaços públicos, afetando o comércio e parando escolas e empresas, interrompendo a economia local quase que por completo. Além disso, ocorre a desaceleração do turismo, que pôde ser notado no número reduzido de pessoas atraídas pelo feriado do Ano Novo Lunar chinês, ocorrido no final do mês de janeiro deste ano.
Essa data do ano novo chinês causou, também, um prolongamento do feriado pelas autoridades, atrasando ainda mais o retorno dos negócios. Muitas empresas continuarão a ter que pagar suas contas, incluindo salários de funcionários, mesmo não operando. Um exemplo são as franquias do Starbucks, que fecharam temporariamente todas as suas lojas na China para tentar reduzir os prejuízos.
Com a desaceleração da atividade econômica em conjunto com a questão social, torna-se evidente que epidemias e pandemias são eventos que, além de extremamente desoladores, são extremamente custosos. Uma pandemia pode custar à economia mundial cerca de 500 bilhões de dólares segundo os cálculos baseados em eventos passados de Dean Jamison, economista americano líder em estudos de saúde, e Lawrence Summers, ex-secretário do tesouro dos Estados Unidos.Vale ressaltar que nestes custos estão contabilizados fatores como mortalidade e, consequentemente, perda de potencial produtivo e de consumo, dessa forma, com um número elevado de mortes, esse número final pode facilmente crescer. Comparando a estimativa com o cenário atual, somente o governo chinês já destinou US$275 bilhões na contenção do distúrbio, até o momento.
O bloqueio
Enquanto a China sofre com seus problemas internos, o mundo começa a se fechar para ela com o objetivo de se prevenir da doença. Austrália, Estados Unidos, Singapura já bloquearam completamente a entrada de qualquer indivíduo vindo da China que não seja um cidadão de seu país. Acompanhando-os estão outros 60 países que já impõem algumas barreiras de entrada para aqueles que vêm de zona de risco, como é o exemplo da Rússia, que apenas permite a entrada de chineses em conexões da companhia Aerofloat.
Esse bloqueio de entrada é um claro detrimento ao turismo, agora em âmbito global, uma vez que os turistas chineses gastaram mais de 277 bilhões de dólares ao redor do mundo no ano de 2018. Esse detrimento pode ser visto a partir do gráfico a seguir, que representa a porcentagem dos gastos de turistas estrangeiros no PIB de alguns países asiáticos.
Além do turístico temos o bloqueio comercial. Esse talvez seja o mais desastroso para a China, principalmente quando levamos em conta o contexto da Guerra Comercial. Os EUA elevou as tarifas impostas sobre os produtos chineses, o que por si só já afeta a exportação e deixa empresas sem margens para absorver outros impactos. Entretanto, o vírus e o medo atrelado a ele deixaram compradores externos mais relutantes em comprar produtos da China. Esse fato, em conjunto com a redução do consumo interno, tem deixado o capital estagnado, algo extremamente prejudicial em uma situação em que se precisa de dinheiro para conter a doença.
Assim, diversas multinacionais, como a Amazon, a Microsoft e a Google se juntaram a outras grandes empresas de tecnologia na decisão de fechar temporariamente seus escritórios na China, em Hong Kong e em Taiwan. Além delas, fabricantes de automóveis como a General Motors e a Toyota estenderam o feriado para seus trabalhadores nas fábricas em área de risco,o que impacta tanto a economia chinesa quanto a economia global devido à redução da oferta de produtos nessa mesma escala.
A partir dessas implicações, o mundo se torna refém de seu modo produtivo dependente, criado com o modelo de globalização. Esse aumento de porosidade das fronteiras encorajou as empresas a construírem complicadas cadeias de suprimentos, que por sua vez passam por diversos países. Um país como a China, também conhecida como a “fábrica do mundo” é uma excelente amostra de como uma epidemia pode abalar a economia mundial. A Hyundai, por exemplo, na Coréia do Sul, teve que suspender a sua produção, mas por um motivo diferente de suas concorrentes: essa suspensão ocorreu devido à falta de insumos provenientes da China.
O gráfico a seguir mostra a participação da China na cadeia de suprimentos de outros países como uma porcentagem do valor acrescentado bruto da atividade produtiva desses países:
Ademais, a China é uma importante exportadora do setor de eletrônicos mundialmente. A maioria dos telefones celulares e computadores pessoais são produzidos lá, ou pelo menos possuem partes provenientes do país. A Qualcomm, maior produtora de chips para smartphones, alertou que a crise da saúde tem causado uma incerteza “significativa” sobre as demandas por smartphones e pelas partes necessárias para sua produção.
Essa interrupção de produção e distribuição é extremamente destrutiva para o mercado. Para provar isso basta olhar o exemplo da gigante Apple. Na segunda feira dia 10 de fevereiro de 2020, perdeu 27 bilhões de dólares em valor de mercado. Essa queda de valor é consequência direta da interrupção da produção em fábricas chinesas.
Economistas afirmam que o cenário atual de disrupção do mercado ainda pode ser manejado. Se os casos da doença começarem a diminuir e o número de mortes deixar de aumentar, a China poderia reabrir suas fábricas; o grande problema é que o combate ao vírus não tem sido eficiente. No melhor dos casos, o resultado ainda seria um abalo na economia chinesa e algo significativo na economia mundial. Por outro lado, se o vírus continuar a se espalhar, como tem ocorrido, o dano econômico permanecerá aumentando.
Mercado financeiro
É visível, então, o impacto na economia local e mundial, mas como isso se refletiu na bolsa de valores?
Ao redor do mundo, a bolsa está em queda em relação às semanas que precederam o início da epidemia. O mercado acionário chinês reduziu 8% no primeiro dia de abertura da bolsa após o feriado, refletindo o medo da queda de produtividade no país.
No Brasil, também se torna perceptível como o mercado precifica o cenário caótico da disrupção causada na china, com o impacto negativo nas ações da bovespa. Essa análise fez com que o Ibovespa registrasse uma queda de 3,29% um mês após emitido o primeiro alerta sobre a doença, com a desvalorização, inclusive, de empresas de grande porte.
Exemplos importantes de empresas brasileiras que sofreram com a doença são a Petrobras, que depende do preço do barril de petróleo e sofreu uma queda de 4,21%, e a Vale, que sofreu um tombo de 6,12%. As duas porém já começaram a se recuperar do caos das notícias recuperando 2,35% e 1,37% respectivamente na semana seguinte.
No curto prazo é provável vermos uma queda, como já está ocorrendo, na bolsa chinesa. Essa epidemia terá um impacto na maioria das empresas que dependem da China, tanto para sua produção, quanto para o consumo de seus produtos. Dessa forma, cabe analisar calmamente a situação de cada empresa e mercado para não perder muito dinheiro nesses tempos de crise.
Evitando o pior cenário
Em situações de epidemia, o Fundo Monetário Internacional (FMI) recomenda, acima de tudo, a colaboração entre os países para combater a doença. Isso inclui incentivar pesquisa de vacinas para controlar o vírus e disponibilizar trabalhadores das áreas médica, militar e de segurança pública para aplicar as medidas contrárias à infecção.
A Organização Mundial de Saúde atualmente pede 675 bilhões de dólares para responder a essa epidemia de forma global. Seu plano tem o seguinte foco: estabelecer coordenação internacional e apoio operacional, ampliar as operações de prontidão e resposta e acelerar a prioridade de pesquisa e inovação. Em suma, os esforços governamentais podem surtir efeito positivo no combate a esse distúrbio, que por sua vez já mostrou seu alto impacto social e econômico. Por outro lado, sem o controle da variável "tempo" torna-se extremamente difícil estabelecer os limites e a duração das mazelas que o Coronavírus ainda pode causar à população mundial.
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